terça-feira, 18 de março de 2014

Todo dia é Dia do Brinquedo!


Professora fotografa seus alunos em momento de descontração com os brinquedos trazidos para a escola, na EMEI Guia Lopes. 
Foto: Marina Piedade
Na escola onde você trabalha, as crianças podem levar brinquedos todos os dias? Ou deve haver um dia específico para isso? E o celular, pode ou não pode? Acessar a internet, ouvir música… É adequado fazer isso durante as aulas?
Essas são algumas das perguntas que nos acompanham diariamente! Porém, nossas respostas nem sempre se baseiam em argumentos com embasamento científico e que sejam justos para as partes envolvidas, ou seja, que considerem de forma equilibrada os diferentes pontos de vista. Aliás, na maioria das vezes, nos pegamos usando a famosa frase “é regra da escola” como resposta negativa para o ingresso de “objetos estranhos” à aula. Pois bem! Esses temas, tão presentes em nossas vidas de educadores, serão tratados em uma série de posts que começa hoje!
Neste texto vamos falar especificamente sobre a prática do “Dia do Brinquedo”. Muitas escolas adotam um dia na semana, geralmente a sexta-feira, para liberar a entrada dos brinquedos (nas turmas da Educação Infantil). Nos meus encontros com educadores, quando abordo essa questão durante as formações, constato que é quase unanimidade limitar essa atividade para um dia específico. E é claro que pergunto: “Por quê? Qual seu argumento?”. Chega a ser divertido perceber as fisionomias… Como mineira que sou, traduzo os olhares dos educadores com nosso famoso: “Uai, porque sim!”.
Brincadeiras a parte, as justificativas apresentadas são sempre respostas vazias, sem fundamentação teórica. Geralmente a escola adota essa prática por entender que o brinquedo será um elemento complicador, gerador de conflitos. Portanto, “… deixemos para a sexta, porque sendo o último dia de aula da semana, teremos sábado e domingo para repormos as energias gastas nos transtornos que o Dia do Brinquedo causa”.
Outra justificativa recorrente é a preocupação de o brinquedo ser quebrado e o desgaste que o fato proporcionaria na relação com a família. Sabemos que nem sempre é agradável a forma como as famílias abordam a escola em situações como essa. Pensando de antemão no prejuízo material, há uma tendência de os pais ou responsáveis acusarem o professor de negligência. E quando isso acontece, é necessário que o professor tenha os argumentos necessários para enfatizar que os danos de um brinquedo quebrado são (ou deveriam ser) menos importantes do que os ricos momentos de socialização favorecidos pelo objeto. Há também o receio de a criança não prestar atenção suficiente nas atividades. Enfim, todos os argumentos se orientam para a antecipação e o impedimento do conflito, entendido, portanto, como algo negativo, que deve ser evitado.
Mas, se evitamos o conflito, como poderemos alcançar nosso objetivo de formar para a autonomia? O que precisa ser entendido é que, além do papel lúdico do brinquedo, também há nele uma carga afetiva: a criança deseja levar para a escola um “pouco de sua casa”, do seu “porto seguro”. Quanto ao receio de os brinquedos se tornarem causa de conflitos, sugiro que usemos dessas situações para um trabalho de construção da boa convivência.
Você pode perguntar: mas como, se os alunos disputam e choram por causa deles? Pensemos juntos…
A disputa pelo objeto, comum entre crianças pequenas, é explicada pelo estágio de desenvolvimento em que se encontram. Querer ficar o dia todo com seu brinquedo no colo é resultado do acentuado egocentrismo ainda presente nos pequenos. Até por volta de 6 ou 7 anos, elas são incapazes de reconhecer e coordenar outras perspectivas que não sejam suas próprias. E isso não quer dizer que sejam egoístas, mas que não possuem ainda “ferramentas psicológicas” suficientes para considerar os desejos e pontos de vistas das outras pessoas. Nesse caso, a mediação do adulto, promovendo momentos em que todos os envolvidos possam se colocar, dizendo o que desejam e como se sentem, é fundamental para um trabalho de construção da autonomia.
Paralelamente a isso, quanto ao momento adequado de liberar os brinquedos na aula, deve ser levado em conta o respeito às regras construídas pelo grupo (tratamos disso no post “Regras morais e convencionais: qual a diferenças?”). Estamos falando de um trabalho de regulação – e não de controle – da vontade e dos afetos. A autonomia é construída a partir desse exercício de autorregulação – eu desejo, mas não devo fazer tal coisa porque fere uma relação de respeito mútuo, ou seja, eu escolho fazer o certo porque assim me sinto melhor como pessoa.
É evidente que proibir ou limitar o brinquedo vindo de casa é bem menos trabalhoso para o educador e para a escola. Porém, são atitudes que não contribuem para o desenvolvimento da autonomia de nossos alunos. Podemos considerar ainda que o trabalho diário com os brinquedos causa menos expectativas (tanto para o aluno como para o professor) do que esperar aquele dia específico. Menos expectativa, menos ansiedade, portanto, menos probabilidade de confusão. Trata-se de habituar a criança ao momento do brinquedo, o que implica estimular trocas, empréstimos e zelo com o objeto. Enfim, ótimas oportunidades para o desenvolvimento moral dos pequenos.
Depois dessa reflexão, qual sua opinião? A escola deve ou não manter o Dia do Brinquedo? [...].

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